quinta-feira, 27 de junho de 2013

O Futuro Mercosul

Autoria Conjunta das Drªs Cristiana Maia e Caroline Debatin
Publicado 16 de junho de 2011 na Revista Universitas: Relações Internacionais.

Com o fim da Guerra Fria e a conseqüente ascensão dos Estados Unidos ao status de potencia mundial, surgiu à necessidade de uma maior integração internacional por parte dos demais países, como forma de proteger suas economias e adquirir maior potencial competitivo.

Neste diapasão, foi criado o MERCOSUL, que consiste em um bloco econômico que tem como principal objetivo a livre circulação de mercadorias e o estabelecimento do compromisso, por parte dos países membros, de harmonizar suas legislações para lograr o fortalecimento deste processo de integração.
O processo de integração nada mais é do que a cooperação entre países, que são, via de regra, geograficamente próximos ou possuem algum tipo de afinidade (cultural e/ou comercial), com o fim de mitigar as barreiras econômicas existentes entre os mesmos, viabilizando, desta forma, a livre circulação de mercadorias, pessoas e capitais e, por conseguinte, aumentar a competitividade destes Estados no cenário internacional.

Com o fenômeno da globalização, torna-se absolutamente necessária a cooperação entre países no âmbito econômico mundial, uma vez que, isolados, não conseguiriam se firmar no atual sistema capitalista.

O MERCOSUL é composto por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, tendo sua origem no Tratado de Assunção, celebrado em 1991. No advento de sua criação, o tratado possuía primordialmente uma finalidade econômica.

Em 2002, com o “acordo sobre Residencia para Nacionais dos Estados Partes do MERCOSUL", o tratado ganhou uma maior abrangência, dispondo acerca da circulação de pessoas nos países pertencentes ao bloco, demonstrando uma tímida intenção de aprofundar as relações integracionalistas entre os Países membros.

Tal objetivo secundário pode ser visto, inclusive, na Constituição Brasileira de 1988, conforme está disposto no artigo 4º em seu parágrafo único , bem como no próprio Tratado de Assunção em seu artigo 1º, quando trata da intenção dos Países Membros de acelerar um processo de integração entre eles.

Atualmente, o MERCOSUL encontra-se numa fase de transição, na tímida tentativa de aproximar-se da bem sucedida União Européia. Porém ainda falta um longo percurso até que tal objetivo se concretize, sendo marcado por diversas crises sejam estas no âmbito econômico ou  político mundial.

Com o advento da última crise econômica, muitos consultores defenderam a idéia de que uma renovação mais radical do MERCOSUL seria a solução para evitar que os efeitos dessa crise econômica mundial de 2008 o atingissem de uma forma irremediável , posto a existência de diversas peculiaridades na formação do MERCOSUL.

Deve-se lembrar que a grande diferença econômica entre os países membros do MERCOSUL o enfraquece como bloco integrado, gerando diversos problemas internos como a impossibilidade da adoção de uma moeda única. Um exemplo desta disparidade é o fato de que o MERCOSUL possui um PIB de três trilhões de dólares, sendo que 70 % desse valor corresponde ao Brasil. Tal assimetria, por vezes, levou os demais países do bloco a adotarem medidas restritivas ao comércio, como as salvaguardas, a fim de proteger suas economias em relação ao Brasil, medidas estas vetadas pelo Tratado de Assunção por descaracterizarem o fenômeno do bloco econômico.

Tal enfraquecimento é visto especialmente em momentos de crise, como a que assolou o Brasil e a Argentina em 1999, gerando desemprego e recessão, os países economicamente mais fracos são levados a adotar medidas protecionistas. No caso da crise de 1999, o governo argentino chegou a regulamentar um sistema de salvaguardas que seria também aplicável aos demais países do MERCOSUL. Tratava-se da resolução nº 911, geradora de uma rápida reação por parte do governo brasileiro, tendo este buscado  apoio dos demais países do bloco para suspendê-la.
Outro ponto contundente que merece destaque é a falta de equilíbrio na atuação das relações comerciais dos estados membros do MERCOSUL, onde temos o Brasil e a Argentina muito atuante, enquanto os demais países possuem intercâmbio comercial bem menor, tornando, desta forma, certos acordos internos desvantajosos para estes últimos, afastando o bloco de seus objetivos originais como a adoção de uma moeda única e uma maior harmonização entre países membros.
Tais problemas, somados à tradicional inércia do MERCOSUL em relação a mudanças concretas em suas políticas, deixam em dúvida sua capacidade de, um dia, atingir os objetivos aos quais se propôs em sua criação, em especial no que concerne à integração efetiva entre os países da América Latina, como acorreu na União Européia.
Pode-se dizer que a utopia de uma união interamericana tem origem no processo de formação dos Estados Unidos da América. Com a proximidade geográfica entre os Estados europeus e sua integração tornou-se possível fomentar o sentimento de identidade européia. Aquele que antes era português, espanhol ou alemão, apesar de ainda o ser, tornou-se também europeu.
Diferentemente, os países americanos não se permitiram tal adjetivação, tanto pela necessidade de identificarem-se com seus próprios países de origem quanto pelo lema estadunidense A América para os americanos. Diante da exportação maciça da cultura estadunidense, o termo americano tornou-se um adjetivo inerente apenas aos de nacionalidade estadunidense. Tal fenômeno incentivou a segregação do Continente Americano em três. Os colonos que saíram da Europa e foram para a América do Norte deram origem ao povo que, ao se revoltar contra o domínio inglês e tornar independentes as treze colônias intitularam-se americanos, muito se diferenciando da independência dos países da America Latina.
O processo de independência dos Estados Unidos da América deu-se mediante a chamada Guerra de Independência e, em 1776, este já era um país independente. Entretanto, não seria incorreto afirmar que antes disso já se falava em uma cultura americana. Foi justamente isso que possibilitou a união das Colônias contra o domínio Britânico.
Os países americanos levaram em torno de duzentos anos para conseguir a total independência política da Europa.
Na America Latina, pode-se dizer que tal processo foi marcado pela peculiaridade com que cada país conquistou sua independência, sob a névoa do iluminismo no século XVIII. O Suriname, último país a fazê-lo, só o conseguiu em 1975. No entanto, foi somente após a Revolução Francesa que este processo de descolonização mostrou-se mais intenso.
Embora a União Européia tenha sido a inspiradora do MERCOSUL, existem diferenças profundas entre as duas organizações. Pode-se dizer que o MERCOSUL encontra-se em um estágio anterior ao da União Européia, preconizando a instituição de um mercado comum, por meio de uma união aduaneira e da livre circulação dos bens e das pessoas, enquanto a União Européia preconiza uma união econômica e monetária, além de ter concretizado uma integração econômica e política. Outro ponto que difere esses dois blocos econômicos foram os fatores que levaram à associação. Enquanto na Europa tal associação se deu devido à conjuntura do pós-guerra, no Cone Sul tal se deu devido à necessidade de globalização e interdependência .
Por fim, outro ponto que culminou no sucesso da integração européia, diferentemente do MERCOSUL, foi o fato de haver uma menor heteronímia sócio econômica entre os estados partes. Tal realidade permitiu uma prosperidade nunca experimentada pelo bloco sul americano que, até o presente momento, enfrenta dificuldades em razão da atual presença dos focos ditatoriais em países como Bolívia e Venezuela, impedindo uma maior integração entre estes países e o Bloco.
O processo de integração pretendido pelo MERCOSUL só poderá se concretizar quando os Estados membros alcançarem uma harmonização da vontade política, cooperação e participação de todos os setores envolvidos, em razão de serem as economias dos países-membros economias concorrentes.
Desta forma, surge a dúvida se essas sucessivas crises que vêm atingindo a America Latina não irão influenciar em uma possível involução do MERCOSUL, visto que este está estruturado em um sistema democrático de governo de fraca influência política, e, ao mesmo tempo seus Países Membros estão cercados de formas de governo ditatoriais em seus países visinhos.
Tal perspectiva, ou a falta dela, cria grande insegurança. Os Estados que compõem a America do Sul veem-se diante da escolha entre um imperialismo brasileiro ou estadunidense.
A inaptidão dos países sul americanos para a democracia torna-se cada vez mais evidente e uma coexistência como a européia requer um sentimento de americanismo que, até o momento, inexiste.
Diferente da União Européia, o MERCOSUL encontra-se marcado pela diferença cultural e econômica. De um lado, há dois países de proporções continentais enquanto que, do outro, há outros dois pequenos vizinhos, tanto econômica quanto geograficamente.
Na esperança de um futuro para o MERCOSUL, a integração é um grande desafio, que engloba questões muito mais profundas do que a proximidade geográfica e o idioma. Devem ser observadas as ideologias políticas, metas econômicas e, acima de tudo, o respeito às diferenças de cada Estado, sem o predomínio de imperialismos protecionistas.

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